Tila Avelino: a guia de Jorge

18/06/2016 · Por Ana Ferrareze

Há 49 anos, na noite de 18 de junho, o céu deslumbrante da Chapada dos Veadeiros anoiteceu com uma estrela a menos: na tarde daquele dia, uma delas foi enviada para iluminar a vila de São Jorge em terra. Nascia Aristelina Avelino do Nascimento, a Tila. Na época, o garimpo ainda era a principal fonte de renda da região. As crianças madrugavam junto aos pais em busca dos cristais que ao final do dia trocariam por arroz, feijão e farinha. Ainda tinham que correr para ir à escola no período da tarde. E, chegando em casa, buscar a lenha que seria usada para fazer o jantar. Tila cresceu assim, onde a preguiça não tem vez e cada dia é uma surpresa, com ou sem cristal.

Quando o garimpo estagnou e o turismo chegou forte na Chapada, Tila, como boa geminiana, não perdeu tempo. Foi a primeira em muitas coisas: a primeira mulher em São Jorge a trabalhar como guia turística; a primeira comerciante a vender açaí, que se tornaria uma febre de vendas mais à frente; a primeira, junto com a mãe, Dona Dita, e a irmã, Ione, a construir uma casa especializada em cafés da manhã, o Café Rio Preto, que atende muitas pousadas da vila e foi o primeiro a inventar o kit-trilha aos tantos turistas que passam por lá antes de conhecer as cachoeiras.

Depois de tudo isso, e mais alguns empregos que vão do posto de saúde de Alto Paraíso de Goiás ao correio, Tila deu uma nova cartada: topou entrar para a Casa de Cultura Cavaleiro de Jorge ao lado de Juliano Basso. Era o ano de 2004, quando o Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros ainda era menino, em sua quarta edição. Com ela, o evento se tornou gente grande, como tudo o que ela pega pra si. Se hoje você entra no Cavaleiro e acha um deslumbre, é porque tem a mão de Tila ali. Mão e coração, que nessa mulher estão atados por laço forte.

Aristelina: “nome de origem grega, variante de Aristotelina, feminino de Aristóteles, que significa ótimo conselheiro”. Durante o Encontro, todo mundo sabe: pra qualquer coisa que precisar, chame a Tila. No dia a dia também é assim. Deve ser o nome que mais ouvimos por aqui. É como o oráculo da Casa de Cultura. Para qualquer dúvida, ela encontra uma solução. Se o problema for dos brabos e você estiver errado, a resposta vem acompanhada de um puxão de orelha bem dado: “Viaja não, Ana”. Mas depois vem o abraço, daqueles gigantes, que inundam. Tila sabe abraçar. Acolhe e manda pra longe qualquer insegurança. Se ela estiver do lado, nem precisa apostar: tudo vai dar certo.

Aristelina tem os pés crescidos no chão de terra batida e poeira de cristais da Chapada. As bênçãos das águas do cerrado. A fé que guia os caminhos e protege as vidas que têm a sorte de se entrelaçarem com a dela. A força da gargalhada, que ecoa aos quatro ventos e enche a casa de alegria. O poder do companheirismo e do “estamos junto”. Uma voz que cochicha no ouvido dela em sonho ou acordada, prevendo coisas que vão ou podem acontecer. Tem o peso de uma líder nata, com todas as dores e alegrias que vêm junto a essa missão. “Ana, deve ser difícil escrever sobre a Tila, são tantas histórias que daria um livro”, me diz Geba, Jefferson Passos. Deste livro que ainda tem muitos capítulos a serem escritos, esta é só uma prévia. Com seu coração grandioso, Tila tem muitas novas trilhas a desbravar. Pessoas e lugares a influenciar com sua sabedoria, criatividade, diplomacia e capacidade de transformar.

Neste por enquanto, nosso muito obrigado por ela acreditar.

Um viva à Aristelina, nossa Tila, e à sua força para nos guiar.